Falta de chuva acende alerta para economia alemã
Falta de chuva acende alerta para economia alemã - Seca tem afetado ecossistemas e produção na Alemanha, com incêndios florestais, baixo nível de rios e plantações prejudicadas. Com aquecimento global, tendência é de mais crises hídricas, alertam especialistas.A Alemanha enfrenta uma de suas primaveras mais secas. Choveu menos no período entre o início de fevereiro e meados de abril de 2025 do que em qualquer outro momento nos últimos 100 anos, um mau presságio para a economia, a natureza e o bem-estar humano. Março teve quase 70% menos precipitação do que a média – e uma quantidade de horas de sol digna de verão, o que favorece a evaporação.
Como resultado, o risco de incêndios florestais está em alta. Já foram registrados incidentes nos estados da Turíngia e na Renânia do Norte-Vestfália, atípicos para a época.
O Reno, a via navegável mais importante e movimentada no interior da Europa, tem sido outro indicador contundente da crise hídrica no país. O nível do rio está tão baixo que os navios de carga estão aptos a transportar 25% de sua carga usual. Os custos de transporte aumentaram, o que deve pressionar os preços ao consumidor, apontam especialistas.
A Associação Alemã de Cidades e Municípios, que representa milhares de autoridades locais, pediu à população que economize água potável.
Solo excepcionalmente seco
A situação é pior no norte e nordeste do país e em partes da Baviera. Essas áreas aparecem como manchas vermelho-escuras no monitor de seca do Centro Helmholtz de Pesquisa Ambiental (UFZ).
Esses dados indicam um nível excepcional de secura da terra, sobretudo da camada de 25 centímetros mais próxima da superfície. "A camada superficial do solo é especialmente importante para o setor agrícola e para as culturas de cereais e gramíneas, que têm raízes muito superficiais", explica o professor Dietrich Borchardt, do UFZ.
O Serviço Meteorológico Alemão e a Agência Federal Alemã do Meio Ambiente são unânimes em afirmar que o aquecimento global aumentará cada vez mais a frequência de indicadores como esses.
Especialistas explicam que a preocupação em relação à falta de chuva vai além. Quando o solo está seco, ele repele a água — o que pode ser visto quando se tenta regar uma planta num vaso com terra seca e a água escorre, sem se infiltrar. Isso significa que, mesmo que chova, a água tem dificuldade em penetrar no solo.
O problema se agrava se chover forte. "Chuvas intensas não contribuem praticamente em nada para a recarga das águas subterrâneas", explica Borchardt. "Em épocas de seca, a chuva cai sobre superfícies que estão impermeáveis, porque quando o solo está ressecado, a água escorre para riachos e rios."
A seca dos últimos meses foi particularmente desastrosa para as águas subterrâneas. Essas reservas são abastecidas principalmente entre novembro e março, época fria no hemisfério norte em que as plantas ainda não estão crescendo e, portanto, não precisam extrair grandes quantidades de água do solo. Em 80% dos locais de medição no estado da Saxônia, por exemplo, os níveis de água subterrânea estão baixos, o que representa um "alerta laranja", explica Borchardt.
De acordo com o UFZ, basta um dia de chuva suave e constante para umedecer o solo novamente. Mas são necessárias várias semanas de chuva contínua para que ela penetre nas águas subterrâneas. E, como alerta Borchardt, é preciso que chova logo. "Se chover só no verão, quase nenhuma gota irá para as águas subterrâneas."
Plantas sob estresse hídrico
"Esta é a época em que as plantas querem brotar e florescer e, para isso, é claro, precisam de água", diz Verena Graichen, da organização ambientalista Bund (Federação Alemã para o Meio Ambiente e Conservação da Natureza). Se a água não vem no tempo certo, as plantas sofrem estresse hídrico precoce, como já está acontecendo com árvores de raízes superficiais, como as bétulas.
Graichen explica que isso torna as plantas mais suscetíveis a pragas e tempestades e cria um círculo vicioso. "Quando as florestas ou pântanos são enfraquecidos pelo estresse hídrico, eles não conseguem absorver tanto dióxido de carbono, o que, por sua vez, contribui para as mudanças climáticas.
Se não chover logo, a agricultura será uma das áreas mais afetadas. "O que realmente colocaria as plantas sob estresse seria uma seca no início do verão, quando os frutos começam a se formar", alerta Meike Mieke, da associação de agricultores do estado de Brandemburgo. A previsão do Serviço Meteorológico Alemão não é animadora — o órgão prevê que a umidade do solo continuará diminuindo.
Há ao menos um alento no atual cenário, que é a queda no consumo de água registrado nas últimas décadas. Na Alemanha, quando mais de 20% da água que se regenera naturalmente ao longo de um ano é utilizada, o país entra em situação de estresse hídrico. Em 2022, último dado disponível, pouco menos de 10% do recurso foi usado.
O problema dos baixos níveis de água
A maior parte desse volume é utilizada pelo setor energético. Em 2022, 6,6 bilhões de litros de água foram desviados de rios para resfriar usinas termelétricas, de acordo com o Escritório Federal Alemão de Estatística – água que é devolvida à natureza praticamente inalterada, segundo os dados oficiais. Mas se o nível dos rios está baixo, a geração dessas usinas é afetada, como ocorreu na seca extrema do verão de 2018.
Com a transição energética na Alemanha, cada vez mais usinas térmicas estão sendo desativadas, diminuindo essa dependência. "A transformação da matriz energética para fontes renováveis significa que, em meados deste século, dificilmente teremos necessidade de resfriamento", afirma Bernd Kirschbaum, da Agência Federal Alemã do Meio Ambiente. Uma das vantagens da energia verde é que as usinas solares e eólicas não precisam ser resfriadas..
Em segundo lugar no consumo está o abastecimento de água potável. Grande parte é destinada ao setor industrial: cerca de 5 bilhões de litros de água de rios e lençóis freáticos vão para as indústrias química e metalúrgica e para a produção de papel. Neste caso, a maior parte da água é utilizada para resfriamento. Há ainda uma necessidade crescente de água para refrigerar centros de servidores de computadores.
Até o momento, a chuva deste ano tem sido suficiente para o setor agrícola, e apenas uma pequena área precisa de irrigação.
Com o avanço das mudanças climáticas, no entanto, isso vai mudar. A previsão é de que, até o fim do século, precisaremos de até quatro vezes mais água para cultivar alimentos — pois choverá menos e porque quanto mais quente fica, mais rápido a água evapora. "Em outras palavras, não podemos mais presumir que haverá água suficiente para cobrir todas as nossas necessidades", diz Borchardt.
Como economizar água?
Se os períodos de seca vão se tornar cada vez mais frequentes, quais as formas mais eficazes de economizar água? "O mais importante é a retenção de água na terra", explica Bernd Kirschbaum. E não há melhor jeito do que permitindo que rios, florestas e campos ocupem mais espaço.
"Um rio com um curso sinuoso absorve mais água quando chove e recua menos quando está seco, sendo muito mais eficiente em reter água", explica a ambientalista Verena Graichen. Nas áreas urbanas, a remoção de superfícies impermeáveis e a aposta em coberturas vegetais podem ajudar a drenar a água para o solo.
As empresas também devem fazer sua parte. "A água da chuva pode ser coletada em grandes áreas operacionais e telhados. Ela pode ser tratada ando por filtros específicos e, em seguida, reutilizada em processos técnicos. O mesmo pode ser feito com as águas residuais que essas empresas produzem", acredita Kirschbaum.
Graichen também sugere que o setor agrícola invista em irrigação por gotejamento e plantas resistentes à seca: "O grão-de-bico e as lentilhas podem sobreviver com menos água do que as frutas vermelhas."
Autor: Katharina Schantz