Zanin toma de ministro do STJ investigação sobre venda de sentenças no Tocantins
Após a Polícia Federal resgatar diálogos que indicam vazamento de dados confidenciais de investigações sob relatoria do ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, o ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, decidiu avocar os autos da Operação Maximus.
Procurado, o ministro informou que não vai se manifestar. O espaço segue aberto.
Noronha é ministro do STJ desde 2002. Foi presidente da Corte entre 2018 e 2020. Antes, de 2016 a 2018, ocupou a função de corregedor nacional de Justiça.
A Operação Maximus foi deflagrada em 23 de agosto do ano ado por ordem de Noronha. É uma investigação sobre suposto envolvimento de magistrados do Tribunal de Justiça do Tocantins com venda de sentenças.
Zanin conduz a Operação Sisamnes - juiz corrupto, segundo a mitologia persa -, que abarca apuração sobre atos de corrupção e vazamento de dados em tribunais estaduais - Tocantins, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul - e também em gabinetes de ministros do STJ.
Zanin tomou os autos da Maximus no âmbito de uma outra operação, a Maet, bem mais antiga, de dezembro de 2010, que também teve como alvo desembargadores do Tocantins e relatoria de João Otávio de Noronha.
Os diálogos que sugerem escoamento de dados sigilosos no STJ foram capturados pela PF no âmbito da Maximus, mas se referem essencialmente a detalhes da Maet.
São conversas do prefeito de Palmas, José Eduardo de Siqueira Leite com o advogado Thiago Marcos Barbosa de Carvalho, sobrinho do governador do Tocantins, Vanderlei Barbosa - este, investigado desde o ano ado na Operação Fames-19, sob suspeita de desvios de verbas da merenda escolar durante a pandemia.
O advogado Thiago de Carvalho está preso desde 9 de abril. Sua defesa ingressou com habeas corpus. Decorridos mais de 60 dias, o pedido ainda não foi julgado.
As conversas que a PF recuperou são de junho do ano ado, quando estava em curso, sob sigilo, a investigação que culminaria na Operação Maximus, em agosto, colocando sob suspeita desembargadores e juízes de primeiro grau. Os arquivos de áudio foram criados em 26 e 28 de junho. O prefeito revela proximidade com o ministro Noronha, um relacionamento que já vem desde a época da Operação Maet - deusa da Justiça, segundo a mitologia egípcia -, que apontou esquema de venda de decisões e fraudes em ações de precatórios no TJ do Tocantins, envolvendo desembargadores, procuradores, servidores do Judiciário e advogados.
Em um diálogo, Siqueira Campos antecipa a Thiago de Carvalho que o ministro Noronha seria o relator da Operação Maximus. "Há quem diga que agosto começa a ruir no Estado", alertou o prefeito, que acabou, ele próprio alvo de buscas da Polícia Federal em seu gabinete e residência.
"Nem acho que este Campbell será o relator do novo caso", seguiu o prefeito em referência ao ministro Mauro Campbell, corregedor nacional de Justiça. "Desembargadores eu já até sei quem é o relator; Eu já até sei um outro cara duro, por sinal. será relator do novo caso. "
Thiago arriscou um nome, provavelmente do Tribunal de Justiça do Tocantins. "Não, não, o relator é Noronha, Brasília", informou Siqueira Campos.
"Ah, você fala em Brasília, entendi, achei que era questão de prevenção se fosse por aqui", disse o sobrinho do governador.
Siqueira prosseguiu. "Não, não ...aqui é o seguinte, aqui vão dançar 2 juízes, pelo menos 3 advogados, e o Thales e muito possivelmente o pai e a Angela. Eu acho que a notícia contra o Helvécio e a Ângela já chegou nas mãos da Corte Especial (do STJ) através do ministro Noronha."
A essa altura da conversa, o prefeito de Palmas fala de um encontro que teria tido com o ministro do STJ 'há 15 ou 18 anos', em Brasília, na residência de um advogado criminalista. Na ocasião, disse Siqueira Campos, ele foi alertado por Noronha sobre uma operação que estava para ser desencadeada, a Operação Maet, em dezembro de 2010.
"Esse Noronha, há 15 anos, 18 anos, ele me chamou em Brasília e falou pra mim. 'Siqueira, só pra avisar ao teu pai que vão ser afastados 4 desembargadores', acho que tem mais de 20 anos isso, 'vão ser 4 desembargadores'."
(O pai do prefeito de Palmas, José Wilson Siqueira Campos, havia acabado de ser eleito governador do Tocantins, em outubro de 2010 - ele foi o primeiro chefe do Executivo estadual, em 1988. Morreu em 2023.)
O prefeito de Palmas detalhou a Thiago de Carvalho como teria sido o encontro com o ministro Noronha, às vésperas da Operação Maet. Para os investigadores, o conteúdo do diálogo indica que os magistrados sob investigação, na ocasião, seriam relacionados ao pai de Siqueira Campos.
"Esse Noronha me chamou em Brasília, me chamou num reservado e falou. 'Siqueira eu adoro teu pai, tenho certeza, li os autos, não tem nada sobre ele, mas nós vamos ter que afastar esses 4 (desembargadores)'. Eu falei pra ele 'graças a Deus', que viraram 4 bandidos, isso é o fato, viraram 4 bandidos. Então já tem uma outra novela pra acontecer que é essa."
A Operação Maet levou juízes para a prisão. Eles se tornaram réus em ação penal ainda em curso no STJ. A Polícia Federal cumpriu nove mandados de condução coercitiva e fez buscas em quase vinte endereços em Palmas, por ordem do ministro Noronha.
A suspeita é que juízes teriam ligação com venda de sentenças e que recebiam, na época, contracheques em valores superiores a R$ 100 mil do Tribunal de Justiça do Tocantins.