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OPINIÃO

Marina Silva e o direito das mulheres à liderança e respeito

Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva abandona audiência da Comissão de Infraestrutura após desentendimento com senadores - Reprodução/Agência Senado
Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva abandona audiência da Comissão de Infraestrutura após desentendimento com senadores Imagem: Reprodução/Agência Senado
do UOL

Jessika Moreira*

Colunista convidada

29/05/2025 05h30

Assistimos de novo ontem a um lamentável episódio de misoginia, assédio moral e desrespeito contra uma mulher, negra, nortista, e que ocupa o maior cargo no executivo federal, a ministra do Meio Ambiente Marina Silva. É inissível ver e ouvir o que ocorreu na audiência da Comissão de Infraestrutura do Senado e que culminou no abandono da ministra do plenário. Pior ainda é a evidente quebra de decoro não ter gerado punições aos senadores aviltantes de Marina Silva.

Este episódio reflete uma realidade no país: a perpetuação da violência política contra mulheres no ambiente público. As tentativas de silenciá-la, os comentários ofensivos e a postura desrespeitosa de alguns senadores revelam a dificuldade que mulheres em cargos de decisão e de poder têm que enfrentar cotidianamente em seus postos. Lugar de mulher é na liderança e onde mais ela quiser, senhores senadores!

Infelizmente, esse fato não é isolado, mas parte de um padrão estrutural que impacta mulheres em diversas áreas da istração pública. Uma pesquisa lançada no fim do ano ado pelo Movimento Pessoas à Frente ("Mulheres em cargos de liderança na burocracia federal: reconhecendo desafios e identificando caminhos para a igualdade") mostrou que a presença de mulheres em cargos de liderança no Executivo Federal diminui na medida em que o nível hierárquico aumenta. Ascender na carreira é difícil, permanecer nela, ainda mais. Segundo o estudo, a estrutura machista e o sexismo no ambiente profissional no setor público são denunciados por 64,2% das entrevistadas, enquanto o desrespeito no trato, incluindo assédio moral, atinge 45,7% das entrevistadas.

Não à toa, o Brasil ocupa o último lugar (15º) no ranking de participação feminina em cargos de liderança na América Latina, segundo estudo do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), de 2022. Além disso, apenas 27% das posições de secretaria executiva e subchefias no país são ocupadas por mulheres, contra 73% de homens. Considerando a questão de raça, o número se mostra ainda mais desafiador: somente 8% delas são preenchidas por mulheres negras.

Neste contexto estarrecedor para nós, mulheres e líderes, fica ainda mais difícil ver a manobra dos senadores ao impor uma incompatibilidade entre "ser uma mulher" e "ser uma ministra", o que apenas reforça a ideia de que o respeito à figura feminina está condicionado a estereótipos de gênero, e não à sua competência e autoridade. Esse tipo de retórica não apenas fragiliza o debate político, mas também impede o avanço de uma sociedade mais igualitária.

O Brasil precisa urgentemente de um ambiente público mais inclusivo, no qual mulheres possam exercer suas funções sem serem desrespeitadas ou assediadas. Por isso, é fundamental que elas ocupem cada vez mais postos em Ministérios, Secretarias de Estado, no Senado, na Câmara dos Deputados, em posições de alta liderança na gestão pública e privada. Nesse sentido, também é importante que o Senado dê sua contribuição a esse debate votando o Projeto de Lei 1.246/21, que reserva para as mulheres 30% das vagas de titulares de conselhos de istração das empresas públicas, que está na casa para ser apreciado.

Atenção senadores e políticos em geral: não é mais aceitável tamanho desrespeito, em qualquer circunstância e em qualquer posição, mas ainda mais contra uma profissional extremamente qualificada e comprometida com o interesse público, que ocupa um dos principais cargos do país. Mais do que nunca, é essencial expor e repudiar esse tipo de atitude lamentável e garantir que cada vez mais as mulheres estejam em espaços de decisão, com suas vozes ouvidas e respeitadas, sem concessões.

*Jessika Moreira é diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente.

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